Um "cadinho" de mim

São Luís, Maranhão, Brazil
Rita Luna Moraes Assistente Social e Bacharel em Direito. Servidora pública federal aposentada.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

A poesia invadiu o STF e fez-se o fato histórico: o reconhecimento da união homoafetiva como união estável em igualdade de direitos

Há uma semana, assistimos o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecer à união homoafetiva (entre pessoas do mesmo sexo) a mesma natureza jurídica da união estável entre o homem e a mulher que convivem, mesmo sem o casamento. (União estável já assegurada pela Constituição Federal, no capítulo destinado à Família - art. 226, § 3º)

Aqui não comentarei os argumentos jurídicos fundados na igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana. Nem adentrarei nos meandros das discussões hermenêuticas. Embora, os dois dias de sessões, tenham sido pródigos em ambos os aspectos e, sem dúvida, nos sirvam, a nós que nos debruçamos sobre o Direito, como verdadeiras aulas, daquelas que não têm folha de freqüência nem um professor chato a discorrer teorias sem calçá-las na realidade.

Trago a todos que me honram com a leitura deste blogue, o que me emocionou!
Disse-me minha  amiga Jordana, há algumas semanas, que “sou movida pelo emocional”. Ando tão transparente que até os que me recém conhecem me reconhecem!

Assim, parafraseando: “Meninos e Meninas: eu vi, ouvi, li e compartilho!”

A poesia invadiu o STF – nas proposições, nas defesas orais e nos votos dos ministros.     E invadiu as ruas, nas quais, pessoas até bem pouco “invisíveis” no mundo jurídico, foram às lágrimas ao verem reconhecidos como seus os direitos antes ofertados apenas aos outros.

O ilustre Professor Luís Roberto Barroso (UERJ), (para mim, o maior constitucionalista brasileiro contemporâneo, especialmente, no que se refere à constitucionalidade das normas jurídicas), e cuja página na internet  http://www.luisrobertobarroso.com.br/inicial.html   sugiro a todos (sim, a todos, e não apenas aos amigos do Direito, pois trata de Direito, Música e Poesia) trouxe em sua brilhante sustentação oral (a defesa) a beleza que todo texto jurídico deve conter, possível de ser assistida nos links abaixo do youtube:


Para dar o gosto a que assistam os vídeos, apenas destaco os seguintes momentos poéticos, inseridos na forte argumentação jurídica que fez em plenário do sóbrio STF:

“O que vale a vida são os nossos afetos.”, disse ao iniciar a defesa. (grifado por mim)

“O amor que não ousa dizer o seu nome.”, citando Oscar Wilde, do poema Two Loves, ao situar historicamente a perseguição a que estiveram sempre submetidos os homossexuais.

Do navegador Amyr Klink, trouxe a razão da proposta: “na vida, o maior naufrágio é não partir“.

Ao final, foi advogado, cidadão e pai:

“E aqui concluo, senhor presidente, com o argumento que me parece o mais importante de tudo o que eu lhes disse, disse às vossas excelências até aqui, que é a regra de ouro: “Faz aos outros o que deseja que te façam“.
Eu tenho, como alguns dos senhores saberão, um filho de 12 anos. Que está entrando na puberdade. Minha mulher e eu o educamos dentro de uma cultura convencional, dentro de uma tradição heterossexual, porque o humanismo exige que não seja hipócrita. E, portanto, a vida, integrando as maiorias, é um tanto mais fácil. Porém, senhor presidente, senhores ministros, se a vida, pelos seus desígnios, levasse o meu filho por um caminho diferente, eu gostaria que ele fosse tratado com respeito e consideração.
Com igual respeito e consideração. E que fosse acolhido pelo ordenamento jurídico. E que pudesse viver em paz. Em segurança. E ser feliz.
E se é isso que eu desejo para o meu filho, evidentemente é isso que eu devo desejar para todas as pessoas. Essa é a regra de ouro. Que está no coração do judaísmo, que está no coração do cristianismo, na ética kantiana, na boa fé objetiva, e é a única forma de se fazer o bem.”

No blogue do Professor Barroso, fiz o seguinte comentário, que pode ser lido no link 

Caríssimo Prof. Luis Roberto Barroso,
Emocionei-me muito ao ouvir sua sustentação no STF.
Orgulho-me de cursar Direito (aqui no Maranhão) quando vejo Professores como o Senhor
a nos ensinar de modo tão candente o que não se encontra nos livros acadêmicos.
Com certeza, seu filho de 12 anos tem motivos para se orgulhar do pai que tem!
Saudações!
Rita Moraes

Recolho do voto do Ministro Ayres Britto, relator dos dois processos em julgamento:

“Em suma, estamos a lidar com um tipo de dissenso judicial que reflete o fato histórico de que nada incomoda mais as pessoas do que a preferência sexual alheia, quando tal preferência já não corresponde ao padrão social da heterossexualidade. É a perene postura de reação conservadora aos que, nos insondáveis domínios do afeto, soltam por inteiro as amarras desse navio chamado coração.” (grifado pelo autor)

Ao discorrer sobre o vocábulo “homoafetivo” e suas diversas conceituações, conclui:
“Trata-se, isto sim, de um voluntário navegar por um rio sem margens fixas e sem outra embocadura que não seja a experimentação de um novo a dois que se alonga tanto que se faz universal.” (grifado por mim)

Mais adiante, citando Fernando Pessoa, para tratar da ideia que se tem da homoafetividade:

“O universo não é uma ideia minha./A ideia que eu tenho do universo é que é uma ideia minha”.

Na primeira síntese que faz de seu primoroso voto jurídico-poético, o Ministro Britto:

“Por isso mesmo que de sua rasa e crua desproteção jurídica, na matéria de que nos ocupamos, resultaria brutal intromissão do Estado no direito subjetivo a uma troca de afetos e satisfação de desejos tão in natura que o poeta-cantor Caetano Velloso bem traduziu na metafórica locução “bruta flor do querer”. (grifado por mim, para lembrar que postei a música “O Quereres” neste blogue, de onde se extrai o verso citado)

O Ministro-poeta Ayres Britto (que de fato é autor de vários livros de poesia) ainda nos traz em seu voto outras tantas passagens que valem a pena serem lidas no link http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178792

Voltarei ao assunto, para mostrar outras “pérolas” poéticas desse “julgamento histórico”.

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