Um "cadinho" de mim

São Luís, Maranhão, Brazil
Rita Luna Moraes Assistente Social e Bacharel em Direito. Servidora pública federal aposentada.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

M A R C H A - essa sim!

M A R C H A
Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva)
poeta, ex-preso político

Venho da pátria dos tormentos.
Venho de um tempo de crimes.
Venho das chagas que a noite
lavrou na carne dos homens.

Não pedirei perdão
à corte dos meus carrascos
pelo grito de rebeldia
arrancado do meu sangue,
pelo sonho, pelo sonho,
pelas armas, pela marcha do meu povo, contra os muros!

Como se desata o cereal da terra,
levanto meu corpo de trigo
do corpo estendido de Orocílio Martins, sementeira de fúrias e esperanças – sangrando nas ruas rebeladas de Minas.

Liberto meu canto de pássaro
da voz impossível dos mortos:
luz acesa no porão da treva,
memória enterrada do povo.

E canto pela boca destroçada
do Comandante Carlos Marighella
dez séculos depois do silêncio;
pela garganta emudecida
de Mário Alves, grito eterno que anda;

pelos olhos vazados de Bacuri,
estrelas sangrando na memória;

pelas cabeças cortadas no vale do Araguaia, terra de rebelião;

pelo peito metralhado do Capitão Carlos Lamarca, granito de sonho enterrado, entre as pedras do sertão;

pelo corpo mutilado de Manoel Raimundo Soares,
nas águas do Rio Guaíba,
sangue dos ventos do sul;

pelas mãos atadas de Alexandre,
arados de terra livre; pelo sangue derramado de Aurora Maria do Nascimento, promessa de amanhecer.

E me faço boca de todas as bocas
assassinadas, canto de todos os cantos aprisionados, sonho de todos os sonhos submergidos, pela mão armada dos carrascos do meu povo.

Hoje, o Poder se absolve dos seus crimes. Mantém à sombra dos seus murosos açoites e as vergastas.
Recolhe sob a manga verde-oliva
as mãos ensangüentadas dos verdugos

e espera...

E as mães aflitas do povo tecem nos cegos teares da dor um espesso tecido de agulhas infinitas:

Quem responderá pela morte
dos meus filhos?

Quem responderá pelos torturados
até a loucura?

Quem assassinou a esperança
de Frei Tito?

Quem prestará contas ao meu coração
pelo destino dos devorados?

Pelas vidas, pelos sonhos
que a Noite transformou em cruzes?

Hoje, o Poder se absolve dos seus crimes. Recolhe sob a manga verde-oliva as mãos ensanguentadas dos verdugos 
e espera...

Do ventre fecundo, das filhas do povo, das cinzas dos ranchos,
da terra queimada, das marchas, das greves,das ruas feridas
nascerão seus julgadores!

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